Lei que autoriza postos em mercados fica parada 8 meses na Câmara do DF

Mateus RodriguesDo G1 DF

Projeto de lei complementar 5/2015, do deputado Chico Vigilante, autoriza instalação de postos em mercados e shoppings do DF (Foto: CLDF/Reprodução)Projeto de lei complementar 5/2015, do deputado Chico Vigilante, autoriza instalação de postos em mercados e shoppings do DF (Foto: CLDF/Reprodução)

O projeto de lei que autoriza supermercados e shoppings no Distrito Federal a vender combustíveis está parado na Câmara Legislativa há oito meses, quando começou a nova legislatura. Visto como alternativa para aumentar a concorrência e reduzir preços, o tema voltou à tona após a prisão de cinco empresários do DF na operação Dubai, da Polícia Federal.

Defensor da proposta há vários mandatos, o deputado Chico Vigilante (PT) protocolou o projeto de lei complementar 5/2015 em 11 de fevereiro. O texto revoga trecho de uma lei de 2000 que proíbe a construção de postos de combustível em estacionamentos, mercados, teatros, cinemas, shoppings, escolas e hospitais públicos. Pela nova lei, a implantação do comércio fica condicionada a estudos ambientais e ao pagamento de taxas.

Em 20 de março, o deputado Wellington Luiz (PMDB) foi denominado relator do texto na Comissão de Assuntos Fundiários (CAF), com prazo até 2 de abril para emitir parecer. O relatório só foi protocolado nesta quinta-feira (26), 238 dias após a data prevista, logo após a ação da PF contra o cartel no setor. A próxima reunião da CAF deve ocorrer na próxima quarta (2).

“Estava esperando uma sinalização do Chico [Vigilante], o parecer está pronto há muito tempo. Quem decide o andamento do projeto é o autor, na reunião de líderes. Na terça, o deputado me procurou e disse ‘deputado, o parecer está pronto? O senhor pode colocar na pauta?’, aí eu apresentei”, afirmou Luiz ao G1 na noite desta quinta.

Site da Câmara Legislativa mostra tramitação do projeto de lei complementar 5/2015, que autoriza instalação de postos em mercados e shoppings do DF (Foto: CLDF/Reprodução)Site da Câmara Legislativa mostra tramitação do projeto de lei complementar 5/2015, que autoriza instalação de postos em mercados e shoppings do DF (Foto: CLDF/Reprodução)

O peemedebista diz que sempre foi favorável à liberação dos postos e que votou pela aprovação do tema em legislaturas anteriores. “Antes, havia um problema em relação à valorização do terreno porque o valor venal não era atualizado. Desde que ele incluiu essa questão da cobrança, sempre apoiei o texto.”

Tema ‘urgente’
Em entrevista ao G1, Vigilante contestou a versão apresentada pelo colega de Câmara e disse que tem urgência na aprovação do projeto.

“Eu estava esperando que o parecer ficasse pronto. É óbvio que o tema é prioridade para mim. Inclusive, venho cobrando constantemente no plenário da Câmara uma atitude em relação a uma série de projetos, que perdem prazos nas comissões e não são apreciados. Estou lutando contra esse cartel há anos”, disse.

Eu estava esperando que o parecer ficasse pronto, é óbvio que o tema é prioridade para mim. Inclusive, venho cobrando constantemente no plenário da Câmara uma atitude em relação a uma série de projetos, que perdem prazos nas comissões e não são apreciados. Estou lutando contra esse cartel há anos”
Chico Vigilante,
deputado distrital

O líder do PT afirmou que tentará aprovar o projeto em definitivo na próxima terça (1º). Para isso, é preciso “queimar etapas” e aprovar, em plenário, os relatórios da CAF e nas comissões de Orçamento, Economia e Finanças (CEOF) e de Constituição e Justiça (CCJ). O acordo para essa votação deve ser costurado na reunião de líderes, também na terça.

Nesta quinta, o governador Rodrigo Rollemberg afirmou à TV Globo que vai enviar um projeto à Câmara para regulamentar a instalação de postos em estabelecimentos comerciais. Na quarta, o chefe do Executivo se reuniu com Ministério Público e Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade), que cobraram a alteração na lei.

“Nos próximos dias, no máximo na próxima semana, nós estamos encaminhando o projeto que regulamenta a outorga onerosa, que vai permitir postos de gasolina em shoppings e supermercados. Mas, nós já vamos orientar a base de apoio do governo que apoie a iniciativa do deputado Chico Vigilante, que já tramita na Casa”, declarou Rollemberg

Cartel na mira
Na terça, a Polícia Federal deflagrou uma operação para desmembrar um grupo que combinava preços na distribuição e revenda de combustíveis no DF e no Entorno. Segundo a PF, o suposto cartel atuava há pelo menos dez anos.

Foram expedidos sete mandados de prisões temporárias, 44 mandados de busca e apreensão e 25 de condução coercitiva (quando a pessoa é obrigada a prestar depoimento). Os mandados da operação, batizada de Dubai, envolvem também as empresas Shell e Ipiranga. Parte deles foram cumpridos no Rio de Janeiro.

O suposto cartel investigado pela Polícia Federal envolvia donos de postos e de distribuidoras que combinariam preços de álcool, diesel e gasolina. De acordo com a polícia, a principal rede investigada vende 1,1 milhão de litros de combustível por dia. Com o esquema, a empresa chega a lucrar diariamente quase R$ 800 mil.

Portaria da Cascol, uma das distribuiboras de combustíveis alvo de operação da PF e do Ministério Público (Foto: Gabriel Luiz/G1)Portaria da Cascol, uma das distribuiboras de combustíveis alvo de operação da PF e do Ministério Público (Foto: Gabriel Luiz/G1)

Por meio de escutas e interceptações de mensagens, os investigadores apontam que a estratégia do grupo era tornar o etanol economicamente inviável para o consumidor, mantendo o valor do combustível superior a 70% do preço da gasolina – mesmo durante o período de safra.

“Com isso, o cartel forçava os consumidores a adquirir apenas gasolina, o que facilitava o controle de preços e evitava a entrada de etanol a preços competitivos no mercado”, disse a PF. “De forma simplificada, a cada vez que um consumidor enchia o tanque de 50 litros – já que cada litro da gasolina era sobretaxada em aproximadamente 20% – o prejuízo médio era de R$ 35.”

De acordo com o delegado João Pinho, empresas donas de postos mantinham acordo com as distribuidoras, que “avisavam dos aumentos. Havia uma grande cumplicidade”, afirmou. Juntas, BR Distribuidora, Ipiranga e Shell detêm 90% do mercado no DF. O delegado disse que o presidente do Sindicato dos Combustíveis do DF, José Carlos Ulhôa, exercia pressão para que os postos continuassem no esquema, por meio de chamadas telefônicas ou em grupos de WhatsApp.

Delegado João Pinho, da Polícia Federal (Foto: Gabriel Luiz/G1)Delegado João Pinho, da Polícia Federal (Foto: Gabriel Luiz/G1)

A BR Distribuidora informou que presta “total colaboração com as autoridades nas diligências”. “A empresa pauta sua atuação pelas melhores práticas comerciais, quaisquer irregularidades serão investigadas e os responsáveis, punidos”, disse a empresa, em nota.

A Ipiranga disse que não teve acesso ao inquérito policial e que vai contribuir “com integridade e transparência, com as informações necessárias aos órgãos de controle”. “As medidas cabíveis serão avaliadas, assim que a empresa obtiver conhecimento do processo.”

A Raízen, licenciada da marca Shell no Brasil, confirmou que um dos funcionários foi conduzido à delegacia e liberado após depoimento. A empresa disse que “age sempre de acordo com a lei, prezando pela ética no relacionamento com todos os seus públicos” e informou colaborar com as investigações.

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