Mateus RodriguesDo G1 DF

O projeto de lei que autoriza supermercados e shoppings no Distrito Federal a vender combustíveis está parado na Câmara Legislativa há oito meses, quando começou a nova legislatura. Visto como alternativa para aumentar a concorrência e reduzir preços, o tema voltou à tona após a prisão de cinco empresários do DF na operação Dubai, da Polícia Federal.
Em 20 de março, o deputado Wellington Luiz (PMDB) foi denominado relator do texto na Comissão de Assuntos Fundiários (CAF), com prazo até 2 de abril para emitir parecer. O relatório só foi protocolado nesta quinta-feira (26), 238 dias após a data prevista, logo após a ação da PF contra o cartel no setor. A próxima reunião da CAF deve ocorrer na próxima quarta (2).
“Estava esperando uma sinalização do Chico [Vigilante], o parecer está pronto há muito tempo. Quem decide o andamento do projeto é o autor, na reunião de líderes. Na terça, o deputado me procurou e disse ‘deputado, o parecer está pronto? O senhor pode colocar na pauta?’, aí eu apresentei”, afirmou Luiz ao G1 na noite desta quinta.

O peemedebista diz que sempre foi favorável à liberação dos postos e que votou pela aprovação do tema em legislaturas anteriores. “Antes, havia um problema em relação à valorização do terreno porque o valor venal não era atualizado. Desde que ele incluiu essa questão da cobrança, sempre apoiei o texto.”
Tema ‘urgente’
Em entrevista ao G1, Vigilante contestou a versão apresentada pelo colega de Câmara e disse que tem urgência na aprovação do projeto.
“Eu estava esperando que o parecer ficasse pronto. É óbvio que o tema é prioridade para mim. Inclusive, venho cobrando constantemente no plenário da Câmara uma atitude em relação a uma série de projetos, que perdem prazos nas comissões e não são apreciados. Estou lutando contra esse cartel há anos”, disse.
deputado distrital
O líder do PT afirmou que tentará aprovar o projeto em definitivo na próxima terça (1º). Para isso, é preciso “queimar etapas” e aprovar, em plenário, os relatórios da CAF e nas comissões de Orçamento, Economia e Finanças (CEOF) e de Constituição e Justiça (CCJ). O acordo para essa votação deve ser costurado na reunião de líderes, também na terça.
Nesta quinta, o governador Rodrigo Rollemberg afirmou à TV Globo que vai enviar um projeto à Câmara para regulamentar a instalação de postos em estabelecimentos comerciais. Na quarta, o chefe do Executivo se reuniu com Ministério Público e Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade), que cobraram a alteração na lei.
“Nos próximos dias, no máximo na próxima semana, nós estamos encaminhando o projeto que regulamenta a outorga onerosa, que vai permitir postos de gasolina em shoppings e supermercados. Mas, nós já vamos orientar a base de apoio do governo que apoie a iniciativa do deputado Chico Vigilante, que já tramita na Casa”, declarou Rollemberg
Cartel na mira
Na terça, a Polícia Federal deflagrou uma operação para desmembrar um grupo que combinava preços na distribuição e revenda de combustíveis no DF e no Entorno. Segundo a PF, o suposto cartel atuava há pelo menos dez anos.
Foram expedidos sete mandados de prisões temporárias, 44 mandados de busca e apreensão e 25 de condução coercitiva (quando a pessoa é obrigada a prestar depoimento). Os mandados da operação, batizada de Dubai, envolvem também as empresas Shell e Ipiranga. Parte deles foram cumpridos no Rio de Janeiro.
O suposto cartel investigado pela Polícia Federal envolvia donos de postos e de distribuidoras que combinariam preços de álcool, diesel e gasolina. De acordo com a polícia, a principal rede investigada vende 1,1 milhão de litros de combustível por dia. Com o esquema, a empresa chega a lucrar diariamente quase R$ 800 mil.

Por meio de escutas e interceptações de mensagens, os investigadores apontam que a estratégia do grupo era tornar o etanol economicamente inviável para o consumidor, mantendo o valor do combustível superior a 70% do preço da gasolina – mesmo durante o período de safra.
“Com isso, o cartel forçava os consumidores a adquirir apenas gasolina, o que facilitava o controle de preços e evitava a entrada de etanol a preços competitivos no mercado”, disse a PF. “De forma simplificada, a cada vez que um consumidor enchia o tanque de 50 litros – já que cada litro da gasolina era sobretaxada em aproximadamente 20% – o prejuízo médio era de R$ 35.”
De acordo com o delegado João Pinho, empresas donas de postos mantinham acordo com as distribuidoras, que “avisavam dos aumentos. Havia uma grande cumplicidade”, afirmou. Juntas, BR Distribuidora, Ipiranga e Shell detêm 90% do mercado no DF. O delegado disse que o presidente do Sindicato dos Combustíveis do DF, José Carlos Ulhôa, exercia pressão para que os postos continuassem no esquema, por meio de chamadas telefônicas ou em grupos de WhatsApp.

A BR Distribuidora informou que presta “total colaboração com as autoridades nas diligências”. “A empresa pauta sua atuação pelas melhores práticas comerciais, quaisquer irregularidades serão investigadas e os responsáveis, punidos”, disse a empresa, em nota.
A Ipiranga disse que não teve acesso ao inquérito policial e que vai contribuir “com integridade e transparência, com as informações necessárias aos órgãos de controle”. “As medidas cabíveis serão avaliadas, assim que a empresa obtiver conhecimento do processo.”
A Raízen, licenciada da marca Shell no Brasil, confirmou que um dos funcionários foi conduzido à delegacia e liberado após depoimento. A empresa disse que “age sempre de acordo com a lei, prezando pela ética no relacionamento com todos os seus públicos” e informou colaborar com as investigações.