Do G1 DF
Os estudantes que ocupavam há cinco dias a reitoria da Universidade de Brasília decidiram desocupar o prédio na noite desta terça-feira (10), depois que a juíza federal Luciana Raquel Tolentino de Moura expediu novo mandado de reintegração de posse e autorizou o uso de força policial para retirá-los.O grupo invadiu o local para pedir o arquivamento do processo administrativo contra os oitos alunos que foram identificados por pular as catracas do restaurante universitário, em quatro ocasiões, e liberar a entrada de outras pessoas, gerando um prejuízo estimado em R$ 29 mil.
Os estudantes estavam mascarados e desceram as rampas acompanhados de duas oficiais de Justiça. Não há novos sinais de vandalismo no prédio, além das câmeras que foram pichadas e viradas para a parede no início da ocupação. Havia cerca de 40 alunos no local.
Mais cedo, os estudantes, representantes da reitoria e defensores públicos da União negociaram a desocupação do prédio. O reitor Ivan Camargo propôs a reavaliação do processo administrativo e sugeriu que os estudantes sejam defendidos por defensores públicos. Durante a tarde, o grupo votou pela liberação do espaço, desde que o reitor assinasse a extinção das ações.
Além disso, a água e a luz da reitoria foram restabelecidos depois que o grupo cedeu e liberou a rampa de acesso a parte dos decanatos.
Nesta segunda-feira (9), estudantes e servidores realizaram uma manifestação musical a favor da democracia e contra ações violentas dentro da instituição. O encontro foi organizado via redes sociais, depois que o professor Roberto Ellery questionou a postura dos alunos que ocupam a reitoria.
Mascarados fechando o acesso à reitoria da Universidade de Brasília (Foto: Isabella Formiga/G1)
A invasão ocorreu por volta das 16h de quinta, depois da reunião com Conselho de Administração, que decidiu responsabilizar os alunos pelo “catracaço” e por depredações ocorridas em festas no campus. Insatisfeitos com o resultado do encontro, cerca de 60 estudantes ocuparam o prédio e bloquearam a entrada com cadeiras.
Identificando-se como ligados a cursos de humanas e usando máscaras, eles também picharam e tamparam as câmeras de segurança com papéis, virando os equipamentos na direção da parede. Várias faixas foram espalhadas pelo local, indicando que o grupo pretende não liberar o acesso.

reitoria da Universidade de Brasília
(Foto: Isabella Formiga/G1)
O reitor, Ivan Camargo, disse que foi “extremamente hostilizado” pelo grupo no dia. Ele conta que tentou conversar com os estudantes, como solicitado por eles, mas que foi “absolutamente agredido verbalmente” durante a tentativa de negociação. Segundo Camargo, o grupo entrou na sala dele e quebrou várias portas.
“Não há apoio nenhum, ninguém apoia isso. Meia dúzia de encapuzados fascistas tentando tomar conta da universidade. Estamos em uma posição muito tranquila de resistência. A gente precisa se opor, mas a gente não pode se opor usando as armas deles, que são a violência. A gente não quer a presença de polícia. A gente quer usar música. A gente precisa de arte, cultura, academia e ciência”, disse o reitor na ocasião.
Sem se identificar, um dos manifestantes classificou a fala de Camargo como “ridícula”. “Essa é realmente a visão dele dos alunos de classe media baixa dessa universidade.”
Outra jovem disse que a ocupação ocorre em resposta à decisão de culpar os oitos estudantes envolvidos no catracaço. “É uma perseguição porque tem galera que nem está aqui”, afirmou.
“A galera pulou a catraca reivindicando coisas, foi um ato de protesto, e eles estão cobrando R$ 29 mil de alunos específicos. Mas não faz sentido, não teve depredação, foi uma coisa que não aconteceu. Nem aqui está acontecendo. O reitor diz que é guerra civil aqui, mas não está rolando depredação, a gente quebrou só a porta de vidro na hora de entrar, mais nada”, completou a garota.
De acordo com a UnB, cerca de cem servidores ficaram sem acesso às suas salas e o trabalho da reitoria estava parado. A instituição aguardava o cumprimento da reintegração de posse, que deveria ocorrer até a noite de domingo.
Diretora do Instituto de Biologia e membro do conselho, Andréa Maranhão disse que a situação estava impedindo que a folha de pagamento dos servidores fosse rodada.
“A gente decidiu que não queria a criminalização desses estudantes, mas queria a responsabilização deles, e que obviamente essa responsabilização poderia ser dada em vários níveis, inclusive no ressarcimento ao patrimônio público. Foi uma decisão colegiada. A gente tinha acabado de tomar essa decisão, e aí os estudantes invadem o gabinete do reitor quebrando portas, enfim.”

O Diretório Central dos Estudante divulgou nota em apoio à manifestação. “Trata-se de um processo administrativo de reparação de danos e responsabilização. Não é um processo judicial civil ou penal, como vem sendo dito. Convém lembrar que todos os envolvidos no processo têm direito a ampla defesa e contraditório”, disse o diretório em nota.
‘Catracaço’
Estudantes contrários à privatização do restaurante universitário promoveram quatro “catracaços” em 2013, pulando as roletas de acesso ao refeitório e liberando a entrada de outros colegas. De acordo com o reitor Ivan Camargo, nunca houve intenção de privatizar o estabelecimento e sim de mantê-lo terceirizado, sem custos a mais para os alunos. Ele afirma que os prejuízos com os protestos chegaram a R$ 29,3 mil.

Na última reunião do Conselho de Administração, os membros informaram que oito estudantes foram identificados por participar dos movimentos. A Procuradoria Jurídica da UnB chegou a informar que no caso havia incidência do artigo 157 do Código Penal (roubo), com pena de prisão entre 4 e 10 anos. A reitoria optou por manter o processo apenas na via administrativa, requerendo a restituição do dinheiro para ressarcimento dos anos.
De acordo com a coordenadora do DCE, Gabriela Sarkis, os envolvidos no catracaço são contrários à ocupação. Ela afirmou acreditar que a pauta dos estudantes é válida, mas não a forma de manifestação.
“Antes a gente tem que tentar as vias institucionais, e não foi isso que aconteceu. No primeiro [ato], não vamos ocupar, depredar o patrimônio público, quebrar a porta do gabinete e entrar. Isso foi errado. Até porque, dos oito estudantes que iniciaram esse movimento e estão sendo processados pelo catracaço, seis são contra a ocupação. Eles estão falando em nome de oito, sendo que seis não se sentem representados por essa ocupação”, declarou ao G1.
O grupo de mascarados, que afirma que a invasão foi motivada pela punição aos oito identificados, afirma que só vai deixar o local quando os processos forem arquivados.
“Na outra ocupação liberamos a reitoria e ele não cumpriu com nada”, disse uma jovem. “A principal coisa é a criminalização. Queremos que arquive. Um dos motivos da gente estar mascarado é o medo de simplesmente identificarem a gente e aleatoreamente nos processar sem provas concretas.”

Foto: Lucas Nanini/G1)
O grupo também diz que é contra a punição a centros acadêmicos por causa de problemas em happy hours. Na última quinta-feira, um evento no Instituto Central de Ciências, principal prédio da UnB, terminou com agressões e três tiros.
“Houve baderna e tudo mais mas eles estão acusando aqueles que não foram os provedores”, disse. “Que fique claro que os happy hour são um processo da cultura universitária, da convivência, da troca de ideias”, diz um jovem. “Não é festa por festa. É uma festa que tem uma politização por trás.”
Ao G1, o reitor disse achar improvável que o processo contra os estudantes envolvidos no catracaço termine com os oito alunos sendo jubilados. “Não, a questão do restaurante, acho que não tem nenhuma condição de [esse grupo] ser jubilado. Mas invadir a reitoria, quebrar as coisas lá dentro, isso eu considero gravíssimo”, disse Camargo.