
Do G1 São Paulo
“Ele sempre deixou muito bem claro que ele era corrupto. Ele falava pros amigos: ‘ah, eu roubo mesmo, o quê que eu vou fazer?’ Ele sempre deixou muito explícito”, afirmou a jovem, que teve um filho com o ex-servidor.
A ex-namorada afirma que procurou autoridades para fazer a denúncia do esquema de corrupção após ter se desentendido com o servidor a respeito da pensão do filho. Ela relata que os desentendimentos começaram durante a gravidez.
Vanessa disse que procurou a Prefeitura de São Paulo para contar o que sabia. A Prefeitura, por sua vez, confirmou que a namorada do fiscal realmente esteve na Corregedoria Municipal para fazer a denúncia. E que e que depois Vanessa foi encaminhada para o Ministério Público.
Relacionamento
A jovem conta que tinha uma rotina de passeios com o servidor. “A gente tinha sempre uns jantares maravilhosos. Viagens muito boas. Avião particular para ir para Angra dos Reis, barco. Isso tudo me deixava muito encantada por ele”, disse. Ela disse ter recebido presentes. “Deu para mim dois colares, duas gargantilhas e me deu aliança de noivado, aliança de casamento depois que engravidei”, disse.
As fotos confirmam a vida de luxo. Vanessa conta que, aos poucos, Magalhães começou a revelar detalhes do esquema de corrupção. “Ele chegava cansado, contava dos problemas do trabalho dele, o que ele enfrentava. Até quando a gente foi morar junto realmente que ficou muito explícito assim”, disse.
Segundo o Ministério Público, Magalhães aceitou falar sobre o esquema de corrupção, a chamada delação premiada, e foi o único dos suspeitos que não teve a prisão prorrogada na última sexta-feira. Eduardo Horle Barcellos, Ronilson Bezerra Rodrigues e Carlos Di Lallo Leite do Amaral permanecerão detidos.
Entenda como funcionava a fraude
O esquema pode ter causado até R$ 500 milhões de prejuízo para os cofres públicos. Segundo a investigação, o grupo fraudava o recolhimento do Imposto sobre Serviços (ISS). Ele é calculado sobre o custo total da obra e é condição para que o empreendedor imobiliário obtenha o “Habite-se”. O foco do desvio na arrecadação de tributos eram prédios residenciais e comerciais de alto padrão, com custo de construção superior a R$ 50 milhões. Toda a operação, segundo o MP, era comandada por servidores ligados à subsecretaria da Receita, da Secretaria de Finanças.
Foram detidos na quarta-feira (30) o ex-subsecretário da Receita Municipal Ronlison Bezerra Rodrigues (exonerado do cargo em 19 de dezembro de 2012), Eduardo Horle Barcellos, ex-diretor do Departamento de Arrecadação e Cobrança (exonerado em 21 de janeiro de 2013), Carlos Di Lallo Leite do Amaral, ex-diretor da Divisão de Cadastro de Imóveis (exonerado em 05 de fevereiro de 2013) e o agente de fiscalização Luis Alexandre Cardoso Magalhães. O fiscal Magalhães fez acordo de delação premiada e foi libertado na segunda-feira (4).
Além dos quatro, são investigados o servidor Fábio Camargo Remesso e o auditor fiscal Amilcar José Cançado Lemos. Apesar da suspeita de envolvimento, nenhum dos dois foi detido. Remesso foi exonerado no sábado (2) . Ele era assessor da Coordenação de Articulação Política e Social, da Secretaria Municipal de Relações Governamentais. Já Lemos foi afastado e deve ser exonerado na terça-feira (5).
Além do processo criminal, todos investigados serão alvos de processo administrativo disciplinar. Uma comissão processante avalia se devem ser demitidos.
A Justiça determinou o bloqueio dos bens dos quatro suspeitos detidos inicialmente. Já foram localizados uma pousada de luxo em Visconde de Mauá, apartamento de alto padrão em Juiz de Fora (MG), barcos, automóveis de luxo. Há ainda indícios de contas ilegais em Nova York e Miami, além de imóveis em Londres.
A investigação foi conduzida em conjunto pelo Grupo de Atuação Especial de Repressão ao Crime de Formação de Cartel, Lavagem de Dinheiro e de Recuperação de Ativos (Gedec) do Ministério Público (MP) e pela Controladoria Geral do Município (CGM) da Prefeitura de São Paulo.
Promotores e Prefeitura dizem que a investigação que culminou com as prisões começou há sete meses. Entretanto, as primeiras denúncias anônimas contra o grupo apareceram no ano passado, mas foram arquivadas por duas vezes. O primeiro arquivamento ocorreu no fim da gestão de Gilberto Kassab (PSD). Na gestão de Haddad, ela foi arquivada em fevereiro, mas já estava em andamento o cruzamento do patrimônio dos envolvidos com a renda,. Os indícios de enriquecimento ilícito levaram à reabertura do processo.
MP e CGM analisaram a ação do grupo entre o fim de 2008 e o fim de 2012. No período, os auditores fiscais emitiram guias do imposto com valores ínfimos e exigiram depósito de altas quantias em suas contas bancárias. O MP apura se as empresas (construtoras e incorporadoras) foram vítimas de concussão, porque não teriam outra opção para obter o certificado de quitação do ISS, ou se praticaram crime de corrupção ativa, recolhendo aos cofres públicos valor aquém do devido.
A Brookfield, uma das incorporadoras citada nas investigações, confirmou, em depoimento ao Ministério Público, o pagamento de aproximadamente R$ 4 milhões de propina. A empresa se diz vítima do esquema. Na segunda-feira (4), Haddad disse que 15 incorporadoras e construtoras seriam investigadas pela Prefeitura.
O esquema rendia cerca de R$ 280 mil por semana com a fraude, segundo MP. Os suspeitos recebiam parte do dinheiro pago por empresas em uma sala no 11º andar da Prefeitura de São Paulo e também em um bar na República, na região central. O grupo operava em um escritório no Largo da Misericórdia, número 23, a poucos metros da Prefeitura. O imóvel era alugado por Marco Aurélio Garcia, que é irmão do secretário estadual de Desenvolvimento Econômico, Rodrigo Garcia, que é filiado ao partido DEM, de São Paulo. Ao jornal “Folha de S. Paulo”, Marco Aurélio confirmou que alugou o imóvel e o emprestou a Ronilson Bezerra.
Tanto em nota quanto em entrevistas, o ex-prefeito Gilberto Kassab (PSD) disse apoiar as investigações. Ao G1, o ex-corregedor-geral de São Paulo Edilson Mougenot Bonfim disse que as apurações foram iniciadas no segundo semestre do ano passado. Entretanto, o secretário de Finanças da gestão do ex-prefeito Gilberto Kassab (PSD), Mauro Ricardo Machado Costa, mandou arquivar a denúncia contra os fiscais por falta de provas. O arquivamento ocorreu em 28 de dezembro de 2012.