Marco Antônio Araújo, R7
Ah, democracia, sua linda, insaciável e gostosa. Que surra você deu nas autoridades deste País. Sobrou para todo mundo, ecumenicamente, como tem de ser. Congresso Nacional, Assembleias Legislativas, governadores, prefeitos, presidente da República. Ninguém ficou de fora da silenciosa e educada pancadaria cívica a que todos assistimos, sem nenhum sobressalto (os incidentes foram tão insignificantes que nem merecem ser computados).
Até a Rede Globo teve sua justa lição de cidadania. O semblante tenso de Patrícia Poeta na abertura do Jornal Nacional é antológico, inesquecível. Uma lavada de alma. Será que a expressão de pânico era decorrente das 50 mil pessoas que naquele instante rondavam o prédio da emissora, em São Paulo? O povo, definitivamente, não é bobo.
Não foram só os funcionários da Velha Senhora que ficaram sem palavras, balbuciando obviedades constrangedoras (e sem nenhuma humildade). A cara de pateta de todos os políticos que tentaram dar alguma declaração sobre as mobilizações reforça o que está por trás do sucesso do movimento: nossos governantes são indignos, maléficos, incompetentes. Não se salva ninguém. Seus projetos de poder são tão parecidos que numa hora dessas a vergonha de todos tem rigorosamente o mesmo tamanho.
Que tarifa zero, que nada. A garotada que deu um show de tática de guerrilha urbana (pacifica! pacífica!) não imaginava que o preço do transporte público pudesse mobilizar uma Nação inteira. Sortuda, sim. Mas soube fazer jus a tanta fortuna. Duvido que seus líderes (praticamente invisíveis) saibam o próximo passo a tomar. Que continuem assim, bons meninos.
E pronto, acabou. É isso aí. Parabéns a todos os envolvidos. A probabilidade de o dia 17 de junho de 2013 mudar a história do Brasil é bem remota. Lamento informar. Não haverá impeachments, nenhum corrupto (daqueles de verdade) irá para a cadeia, até por que nenhuma licitação criminosa será interrompida e estádios de futebol não vão se transformar em escolas ou hospitais. Ah, o custo do busão também vai ficar exatamente onde está.
Infelizmente, vejam só, não vivemos numa ditadura. Caso vivêssemos, bastaria empalar um ditador em praça pública e pronto, tudo faria algum sentido. Mas o Brasil não é um país qualquer. Todos esses malditos vereadores, deputados, senadores, governadores e presidente estão em seus lugares com o voto legítimo, precioso, inalienável e universal de nossos valorosos cidadãos — inclusive daqueles que ocuparam sete de nossas capitais. A isso se dá o nome de democracia. Essa fogosa, deslumbrante e insubstituível democracia. Safada.