Futuro incerto marca venda da Televisión

  Única emissora crítica ao chavismo na TV aberta venezuelana, a  Globovisión muda de donos hoje sob a expectativa de organizações de defesa da  liberdade de expressão no país e também de setores da oposição, que têm no canal  seu único espaço televisivo. A emissora, agora, será controlada por um  empresário do ramo de seguros que, segundo algumas versões, seria ligado ao  chavismo nos bastidores. Por isso, ainda é uma incógnita se o veículo conseguirá  manter sua independência.

A Globovisión ficará nas mãos do economista Juan Domingo Cordero,  ex-presidente da Bolsa de Caracas e acionista majoritário da seguradora La  Vitalicia, uma das maiores empresas do setor na Venezuela. Ele é tio de Ana  Julia Thomson de Zuloaga, mulher de Guillermo Zuloaga, presidente da  emissora.

A aparente proximidade, no entanto, não dá garantias de que a TV continuará  indo de encontro ao governo, diz Andrea Garrido, encarregada do programa de  responsabilidade social e meios de comunicação da ONG Espacio Público, sediada  em Caracas e voltada para a defesa da liberdade de expressão.

— Há uma incerteza muito grande sobre o que está acontecendo — afirmou Andrea  ao GLOBO. — Ainda não sabemos se a Globovisión mudará de linha editorial, mas,  se isso acontecer, será um sério problema para a liberdade de expressão.

Anos de relação turbulenta

Segundo a ativista, o risco é de que a oposição fique sem espaço para  disseminar sua mensagem na televisão, o que já tem ocorrido na prática em  algumas ocasiões.

Nas últimas semanas, por exemplo, pronunciamentos do candidato opositor à  Presidência, Henrique Capriles — que ainda contesta na Justiça o resultado do  pleito do qual o presidente Nicolás Maduro saiu vitorioso, em abril — veiculados  ao vivo pela Globovisión foram interrompidos por transmissões do governo em rede  nacional de rádio e televisão.

A relação entre o chavismo e a Globovisión é repleta de polêmicas e simbólica  da polarização vivida pela Venezuela nos últimos anos. A emissora é acusada pelo  governo de ter apoiado o golpe de Estado em 2002, quando Hugo Chávez ficou dois  dias fora do poder, ao não exibir manifestações a favor do então presidente,  morto em março passado. Depois, em 2010, Guillermo Zuloaga se disse perseguido  pelo governo e fugiu do país rumo aos EUA sob acusação de usura e associação  criminosa — ele teria escondido 24 carros para especular com o preço dos  veículos em uma concessionária.

Todo esse processo foi permeado por uma série de multas milionárias aplicadas  pelo governo contra a Globovisión pelos mais variados motivos. Na última, paga  no ano passado, o governo cobrou US$ 2,6 milhões do canal, acusando-o de ter “incitado a criminalidade” ao cobrir uma rebelião carcerária em 2011 que deixou  dezenas de mortos.

A Globovisión tem alcance limitado pela TV aberta: chega apenas a Caracas e à  cidade de Valencia, no entorno da capital, mas seu sinal está disponível em toda  a Venezuela como TV por assinatura e pela internet. Em março, ao anunciar que o  canal estava à venda, Zuloaga afirmou que a Globovisión era inviável  economicamente por não ganhar dinheiro suficiente; politicamente, por estar  contra “um governo todo-poderoso que quer nos ver fracassar”; e juridicamente,  por causa da concessão que expira em 2015, sem que o chavismo dê qualquer sinal  de que queira renová-la. Em 2007, Hugo Chávez não renovou a concessão da RCTV,  canal com 53 anos de história e que também criticava duramente seu governo. Em  seu lugar, entrou a estatal TVes.

Irmãos em lados opostos na mídia

Na quinta-feira, quando saiu a notícia de que a Globovisión mudaria de mãos  em questão de dias, Maduro disse que seus antigos donos “sabiam que perderiam as  eleições e começaram a vender a Globovisión há três meses”. O presidente pediu  então “um tipo de televisão que diga a verdade, que não estimule o ódio, uma  televisão humana”.

— É lamentável que o presidente ataque um veículo de comunicação abertamente — protestou Andrea Garrido, da Espacio Público.

A esperança dos críticos ao governo recai nos novos diretores do canal,  anunciados semana passada, ambos jornalistas claramente independentes do  chavismo. Um deles é Vladimir Villegas, que passou à oposição nos últimos anos,  depois de ter exercido vários cargos no governo de Hugo Chávez (foi inclusive  embaixador da Venezuela no Brasil). Ele é irmão do ministro da Informação e  Comunicação, Ernesto Villegas, justamente o homem à frente do aparato de mídia  estatal.

Dirigente do partido opositor Avançada Progressista, Vladimir Villegas é tido  como mais moderado que seu colega na direção, Leopoldo Castillo, um ferrenho  crítico do chavismo e apresentador do programa “Aló, ciudadano” — uma resposta  clara ao “Aló, presidente” comandado durante anos nos meios de comunicação por  Chávez. Para Castillo, coube à Globovisión “ser resistência, e agora lhe toca  uma transição rumo a uma nova Venezuela”.

— Em nenhum momento falamos de suprimir programas de opinião. A palavra do  senhor Cordero é de que vamos ao centro — disse Castillo na quinta-feira, dando  uma pista do possível posicionamento do canal em um país politicamente partido  ao meio. Informações de O Globo.

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