O Globo
O atraso nos embarques de produtos do complexo de soja e milho, provocado pelo despreparo do Brasil para escoar e exportar uma safra recorde de quase 200 milhões de toneladas de grãos, causará estragos enormes na balança comercial brasileira, caso os gargalos não sejam resolvidos no primeiro semestre. A avaliação é do secretário de relações internacionais do Ministério da Agricultura, Célio Porto.
Segundo ele, o Brasil precisa correr para aproveitar o período de entressafra nos Estados Unidos — que vai até agosto — para vender seus produtos no exterior. Depois de uma quebra ocorrida em 2012, a safra americana baterá novo recorde com uma produção de 329 milhões de toneladas de milho e 86 milhões de toneladas de soja, respectivamente, segundo dados extraoficiais.
O apagão logístico ameaça o escoamento da supersafra, crucial para melhorar o resultado da balança comercial brasileira. Para se ter uma ideia da importância do agronegócio, a balança do setor apresentou um superávit de US$ 79,408 bilhões em 2012, garantindo um saldo positivo de US$ 19,431 bilhões no resultado global.
— Neste momento, não nos surpreende a grande quantidade de caminhões levando soja e milho para o porto. A questão é que o gargalo pode causar atraso — disse Porto.
O consultor de logística da Confederação de Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA) Luiz Antônio Fayet queixou-se da falta de apoio e do limitado horário de funcionamento das instituições públicas no Porto de Santos, onde há mais problemas detectados. Disse ainda que falta um programa de gestão para organizar a estrutura portuária.
— Estamos falando sobre isso desde 2005 e o problema aconteceu conforme prevíamos. A presidente Dilma Rousseff está pagando uma conta que não é dela. Vamos passar de três a cinco anos penando ainda — Fayet.
Custos maiores para exportadores
Para o presidente da Associação de Comércio Exterior do Brasil (AEB), José Augusto de Castro, além dos gargalos de infraestrutura e logística, que dificultam o escoamento e a exportação de grãos, o sistema é burocratizado e ineficiente.
— O que está acontecendo agora é uma crônica anunciada— enfatizou Castro.
Na avaliação do economista Fábio Silveira, da RC Consultores, os problemas logísticos no caminho para os portos vão encarecer os custos dos exportadores. No entanto, ele acredita que esse entrave não vai se refletir no resultado da balança comercial, que deve registrar superávit de US$ 8 bilhões no fim do ano, segundo projeção da consultoria. A estimativa é que só o agronegócio responda por um superávit próximo a US$ 70 bilhões. Outros setores, como o de petróleo e derivados e o de bens de capital, apresentarão déficit.
— (O problema logístico) vai aumentar o custo para exportar. Mas a safra deste ano vai contribuir em boa medida para evitar um superávit zero ou negativo — disse Silveira.
De acordo com Rafael Bueno, responsável pela área de armazenagem da Companhia Nacional de Abastecimento (Conab), o Brasil tem hoje 143 milhões de capacidade estática instalada, com poucos déficits pontuais, em lugares onde a agricultura está deslanchando somente agora. São exemplos determinados municípios das regiões Centro-Oeste e Norte. Bueno admitiu que qualquer problema na ponta que dificulte o escoamento e o embarque da safra pode atrapalhar o fluxo e, portanto, fazer com que o volume de produtos que precisam ser estocados fique maior do que a oferta de armazéns, o que ainda não aconteceu.
— A armazenagem no Brasil é diferente da de outros países, como os do Hemisfério Norte. Os estoques são sempre renovados rapidamente e, por isso, de forma geral não há problemas — disse.
Para Luiz Henrique Dividino, superintendente do Porto de Paranaguá (PR) — o mais eficiente para o embarque de grãos e desembarque de adubos e fertilizantes — são necessárias medidas de adequação e divulgação dos serviços.
— Criamos um canal de comunicação com os caminhoneiros, informando, por exemplo, sobre eventuais problemas nas rodovias; sinalizamos melhor as estradas em direção ao porto e funcionamos 24 horas por dia — disse Dividino.
Renato Barco, presidente da Companhia Docas do Estado de São Paulo (Codesp), disse que, em função de medidas tomadas ao longo dos últimos dias, a operação do Porto de Santos está dentro de um “padrão razoável de atendimento”, sem congestionamentos. Ele citou mudanças como separação no fluxo das rodovias e segregação de caminhões, de acordo com o seu conteúdo.